sexta-feira, 22 de agosto de 2014

# PROXY 26: Mercenário

Pensei em esmurrar a porta, gritar ou até questionar, mas logo percebi que quem tinha me colocado ali tinha sido Dark. Da última vez que ele me deu um livro pra ler ou mandou fazer algo, terminou por salvar minha vida. Querendo ou não eu tinha passado tempo demais com os proxys e tinha me esquecido que enquanto isso acontecia, mais hospícios foram invadidos e mais elementos foram coletados dos Holders para invocar Ele. O melhor a fazer era ler o livro e resolver minha vida.
O pior de tudo é que eu era claustrofóbico, então naturalmente não me sentia nem um pouco confortável naquela sala, o que dificultaria qualquer concentração. Ainda assim era necessário focar e fazer os procedimentos.
Comecei a ler o livro, aparentemente o que Dark queria que eu fizesse era criar uma cópia minha usando a força da minha mente. Ainda não via onde aquilo resolveria meu problema, mas dei inicio. Criei um amigo (ou inimigo) imaginário e o chamei de Mercenário. Conversei com ele sem muita esperança durante o primeiro dia. Minha conversa consistia em dizer que mesmo sendo criação minha eu já o odiava por tudo que ele carregaria de mim.
O segundo dia tinha chegado, havia dormido com o livro sob minha cabeça. Sem um espelho pra me ver, apenas o tato me guiava. Passei a mão em meu rosto e o senti da mesma forma. Sem boca, sem olho, sem avanço. Nesse dia li mais alguns passos do livro e voltei a conversar com Mercenário. A agonia em saber que o tempo estava passando e nada se resolvia não deixaram o dia ser muito produtivo. Ainda assim persisti para não perder o dia. Periodicamente bolsas de soro eram deixadas próximas a porta da sala, já que não poderia me alimentar normalmente.
O terceiro dia iniciou-se com gritaria. Não sabia o que havia acontecido, mas também não poderia deixar me influenciar. Esse dia passou rápido, mas foi proveitoso. Conversei com Mercenário o dia todo. Fiz uma experiência que deu certo. Coloquei o livro em minha frente e pedi para ele mover o livro de lugar. Foram só 2cm mas valeram todo o esforço até agora. Eu tinha chances. Parabenizei ele e fui dormir.
O quarto e o quinto dia foram cruciais. Coloquei o abajur no centro da sala e em frente a ele o livro. Pedi imaginariamente que Mercenário sentasse do outro lado da sala. Conversamos bastante. No inicio eu criava as perguntas e respostas. Nesses dias as respostas vinham direto aos meus ouvidos. No quarto dia pude ver apenas uma mancha sendo formada ao fundo da sala, enquanto que no quinto já era possível ver uma forma humana, mas indefinida.
No sexto dia foi mais calmo. O abajur era como uma linha divisória entre nós dois. Nenhum dos dois cruzava a linha. Na verdade nenhum dos dois desgrudava de sua parede. Eu sabia que alguém estava lá, sua forma era perfeita, mas não conseguia distinguir quem era ou como era.
O sétimo dia começou de forma crítica. Abri o olho a tempo apenas de ver um vulto se lançando sobre mim e outro atingindo-o fortemente. Assustado levantei e vi Dark ao meu lado. Ele rapidamente falou: “Vamos Master, última parte. Direcione um pensamento firme sobre se livrar de tudo que ficou de ruim em seu corpo para ele e lance uma interferência. Rápido, ele já está consciente!”.
O Doppelganger tinha minha forma como Proxy, as roupas, casaco, máscara. Hora de dar a ele o ponto final. Respirei fundo e lancei com toda a concentração que meu corpo permitia a interferência em Mercenário. Ele rapidamente se debateu e caiu. Um forte queimor se espalhou forte sobre todo meu corpo. Cai ao chão e gritei forte. Exatamente, gritei. Naquele momento percebi que eu estava de volta. Tinha minha boca, meus dois olhos e não sentia mais aquele peso sobre minha cabeça.
Pude levantar com a ajuda de Dark. Sem perder muito tempo fui puxado para fora da sala. “Vamos a um lugar especial!” disse Dark com cara de quem armava algo. Fui levado a uma construção abandonada para mais um experimento. Dark começou a gravar e então do outro lado da câmera pediu para que eu lançasse a interferência. Tentei por várias vezes e apenas uma fraca carga saía. Dark me olhou nos olhos e me mostrou que nem dos óculos eu precisava mais. Estava tudo bem. Era só direcionar e liberar. Respirei fundo e olhei para a câmera. Liberei uma carga com força fraca, mas bem melhor que as tentativas anteriores. Dark sorriu. A interferência tinha funcionado perfeitamente.
Levantamos e apertamos as mãos.
“Devemos contar aos outros sobre isso?” perguntei.
“Não, não agora.” Respondeu Dark, em tom mais sério, “Vamos nessa!”.
“Vamos salvar o mundo!” disse a ele quebrando a tensão.
Ele saiu andando na frente. Fiquei para trás quando senti aquela sensação familiar, o efeito da distorção. Ouvi um barulho e tentei levantar, mas a carga da interferência aumentou. Das sombras daquela sala saiu quem eu menos esperava.
Mercenário surgiu e calmamente andou em minha direção.Ele começou a tirar o capuz e em seguida a máscara. O que vi, mesmo com a visão turva era muito mais perturbador que o fim do mundo.

Mercenário tinha exatamente meu rosto.

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